08 junho 2011

Saltillo (na Luz) apagado da memória

Na sintomatologia futeboleira nacional, a juntar às pesquisas, dialéticas e diatribes sobre a valia duma taça latrina dos anos 50, nem de propósito a FPF homenageou uma conquista qualquer - raríssima, creio que única, daí a recuperação da memória - de há 50 anos (ai o saudosismo; o Benfica até promoveu um vinho seu que remonta a uma treta qualquer de meio século atrás), antes do Portugal-Noruega, de sábado passado, na Luz.


É bom, pelo menos a memória não se perde, mesmo que ande pelas ruas da amargura e carente apenas de números em pontos e vitórias para comparar épocas mais recentes, mas é pena que se evoquem umas coisas e se esqueçam outras. Há 50 anos Portugal ganhou um torneio internacional de juniores, salvo erro, como se isso fosse também uma competição oficial ou daquelas que interessam promover mas não consta do rol de honras da própria FPF como não constava até há pouco qualquer troféu mixuruca nos arquivos dos pasquins lisbonenses (ver http://bibo-porto-carago.blogspot.com/2011/06/fazer-as-contas-por-outro-lado.html).


Entretanto, embora seja compreensível na FPF o facto, mas menos na Imprensa ainda povoada de tantos jornalistas que viveram a coisa por dentro e as 24 horas de cada um desses intensos dias, creio que ninguém evocou os 25 anos de Saltillo: uma rebelião dos jogadores por causa de prémios (coisa não resolvida cá e adiada pela incompetente FPF) de presença no México-86 ficou com o nome da terra que acolheu por um mês (!?) a selecção de Torres. Esse Mundial começou a 31 de Maio e a 3 de Junho, salvo erro, Portugal até entrava a vencer a Inglaterra de Robson, mesmo sem treinar e com os jogadores em estágio de praia nas montanhas do árido norte mexicano... algo de que Futre decerto fala no seu livro cujo portunhol também se adequa a estas aventuras dos chamados "pombinhos de Torres" por terras aztecas. E em breve passará a data, dia 12 creio, da derrota humilhante com Marrocos do brasileiro José Faria que nos deu uma tareia dolorosa (3-1) a seguir à derrota com a Polónia (0-1) que faz precisamente agora também 25 anos.



Esta é a "imagem de marca" de Saltillo, onde os jogadores fizeram greve aos treinos e puderam-se na frente do touro, hoje chamado a "cara na cabeça do polvo" que eram os dirigentes de braços cruzados, e raramente nas fotos, à frente da delegação que se apurara pela primeira vez para um Mundial desde a estreia em 1966, 20 anos depois de Eusébio e os Magriços em Inglaterra e com José Torres a trocar a pele de jogador pela função de treinador de um para outro.


O dirigente sobrevivente de 1986 aí está, 25 anos depois, capaz de ditar sentenças sobre a capacidade de Carlos Queiroz antes do play-off com a Bósnia, de acirrar ânimos corporativos internos e políticos socialistas contra o ex-seleccionador em que não confiava e mesmo de opinar sobre preços de bilhetes (ver http://quatroquatrodois.blogspot.com/2011/06/mais-um-abraco-solidario.html) para o último jogo realizado na Luz.



Antevi que Amândio de Carvalho acalentasse receber uma medalha no 10 de Junho que vem aí, mas Cavaco Silva tem outra ideia de fair-play.


Mas como Madaíl já parece fisicamente recomposto para saudavelmente se recandidatar, pode ser que o eterno Amândio dos tempos de antigamente também mereça a medalha da continuidade. Afinal, Saltillo também fará 50 anos em 2036 e até lá os arquivos da Imprensa poderão perder o rótulo de "classificados" ou "altamente secretos" para manterem o novo povo da bola - daquele que invade os campos como se viu no sábado - up to date com as proezas que de alguma forma eternizam certos protagonistas.


Não admira que a minha delfina de 12 anos não saiba o que é o 25 de Abril, apesar de lhe dar as dicas essenciais à falta de mínimo cuidado escolar para explicar o que foi a Revolução mais do que a mudança da tv de preto e branco para cores, velharia para ela inconcebível...


Não há nada como manter a ignorância fechando a História à chave. Entretanto, promove-se mais algum troféu não oficial e compõe-se a festa que interessa a alguns. Com o silêncio dos coniventes em que não há inocentes.

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