25 abril 2012

O futebol pode ser cruel e o Barça obriga a dizer que "dá cabo" do jogo

Confirma-se a maldição da Champions de o detentor do troféu não lograr o bis e de como a História, afinal, pode repetir-se, casando o azar com a imperícia que não poupa os melhores do mundo e deixa a nesga necessária para reapreciar-se o jogo na sua dimensão global de sentido atlético, de estratégia e até psicológico. Ou não fosse o Desporto mais apaixonante e que mais multidões arrasta.

O Barça, que perdeu o toque de transformar tudo em ouro, conseguiu acertar duas vezes nos postes (uma delas de penálti) outra vez, como sucedeu em Londres; conseguiu até perder a vantagem de 2-0 que lhe dava o acesso à final e mesmo jogando contra 10. Mais items a favor seria difícil, incluindo um penálti para repor a vantagem em 3-1 (Messi à barra, confirmando que não marca ao Chelsea), mas nem assim a melhor equipa da História do futebol logrou cumprir a missão para que foi talhada e incapaz de quebrar a intrínseca essência do jogo de nem sempre os melhores ganharem.
Xavi tinha dito há dias uma verdade intocável: a melhor equipa do mundo não é uma etiqueta, mas um estatuto obtido em campo e que dura há anos. Só que nem sempre se ganha, aviso amiúde repetido depois de tanto esquecido, e até para os melhores a sorte não deve/pode desertá-los, como sucedeu em dois jogos de incríveis cambiantes capazes de atraiçoar os deuses do Olimpo, nesta desconcertante eliminatória com o Chelsea.
A quase perfeição do modelo de jogo do Barcelona impõe, ironicamente, a contradição de o Barça modelar fazer mal ao próprio jogo, levando os adversários a renegarem a sua própria forma de jogar. Já se viu, de forma inédita, em 2009, com o mesmo Chelsea de Hiddink, contra todas as expectativas, a jogar no ferrolho, na defesa porfiada da sua baliza, na aposta em destruir até a alma do seu jogo para dar-lhe uma ou duas centelhas de vida útil especulando com o resultado. Curiosamente, o Barça teve a sorte de passar com o golo nos descontos de Iniesta, numa eliminatória mais falada por penáltis discutíveis mas marcada por outros incidentes então menorizados.
O Inter de Mourinho tornou mais feio, porco e mau esse conceito em 2010, impedindo o Barça de ser de novo plenamente vitorioso como foi em 2009 ganhando todos os troféus em disputa.
Curiosamente, o Chelsea continua a protagonizar, como e com o Barça, as mais extraordinárias cambiantes do jogo e da história dos resultados. Um penálti falhado por Terry em 2008, escorregando na hora de rematar, levando a bola ao poste enquanto CR7 chorava o seu penálti falhado no desempate de Moscovo, retirou o ceptro que parecia nas mãos dos blues então guiados por um treinador repescado, Avram Grant, que rendera Mourinho e merecia ser campeão europeu, tal como hoje é Roberto di Matteo.
O Chelsea que, em 2004, esbanjou o jogo do Mónaco onde conseguiu perder 3-1 e esbanjou o 2-0 cedo conseguido na 2ª mão quando também teve tudo na mão para ir à final de Gelsenkirchen com o Porto de Mourinho.

Na verdade, os altos e baixos do futebol fazem sempre lembrar-nos o velho ditado de desconforto: ninguém diga que está bem. E ninguém está livre disso. Nem mesmo o Barça, cujo estatuto ímpar não sai beliscado nem faz sequer terminar o ciclo grandioso que leva três anos mas sabe-se não durar eternamente. Quem não entende isso nunca entendeu nem gostou de futebol ou admirou a procura da perfeição que, como todas as coisas humanas, e o futebol é feito de homens como Messi que falham penáltis (um nos descontos com o Sevilha na Liga espanhola em casa, 0-0) e como Guardiola, que se baralha nas opções, o Barça mais procurou atingir.
Como a Holanda de 74, ou o Brasil de 82, cada qual com os seus admiradores, o Barça de 2012 conheceu o lado cruel do futebol mas não a falta do reconhecimento de tal forma que não os põe fora-de-jogo na História deste Desporto apaixonante, por vezes rocambolesco e até burlesco e grotesco. Ainda assim, antes ser eliminado pelo sortilégio da bola (quatro nos postes) do que com erros de arbitragem como em 2010.
E faço ainda a analogia com o FC Porto, pois AVB e Vítor Pereira têm o Barça como referência mas também vêem em Portugal gente que não aprecia a assumpção de riscos, o futebol ofensivo, o 4x3x3 sem milongas, a procura da vitória. Nem sempre se alia a vontade à conquista, o bom jogo ao melhor resultado, mas tem sido na tendência ofensiva e na sede de vitórias que o FC Porto cimentou a sua hegemonia nacional e alargada também à arena europeia e mundial. AVB teve o "setback" que se sabe com este mesmo Chelsea onde os jogadores claramente corriam contra o treinador. E VP viveu sobressaltos inimagináveis dos seus próprios adeptos e o vitupério de demais críticos, permanentemente no fio da navalha pela incompreensão das boas-intenções do jogo portista mas entre a falta de correspondência dos jogadores e uma pressão inerente e só própria das equipas que ganham tudo, carregando com a época estrondosa anterior. Sem os favores dos aduladores dos mestres da táctica e da apologia dos extreminadores implacáveis, mas com a consciência do dever cumprido.
Vale a pena pensar nisto.

4 comentários:

  1. Ze Luis,

    Estava a ver que hoje nao ia haver o comentario ao jogo de ontem... :)

    Nao sei porque, mas estes tres ultimos jogos do Barca fizeram-me lembrar os embates do Porto com o Man City...

    Muita posse de bola, a volta da area adversaria, mas a faltar o killer instinct para a meter no capoeiro.

    O que me parece e que o Barca, tal como o Porto aqui no City, comeca a sentir a falta de um homem de area que saiba surgir no sitio certo para encostar. O Villa esta a fazer muita falta... Os baixinhos catalaes, criam muito jogo pelas alas (D. Alves, Tello e Cuenca), mas nao tem para quem cruzar.
    O primeiro golo foi um destes exemplos em que se safou o adiantamento do Busquets... mas na segunda parte, as incursoes pela lateral acabavam com novo passe para a entrada da area...

    O Chelsea limitou-se a gerir o resultado, jogando com o tempo... ate que sofreu um golo e ainda teve a paragem cerebral do capitao (ja sei que, por Portugal, se discute a expulsao "duvidosa", mas apesar das duvidas iniciais, apos a primeira repeticao, os comentadores da SkySports 2 so se perguntavam o que e que teria passado pela cabeca do Terry)...
    Depois do 2-0, desliguei-me do jogo a pensar: Ai vai goleada!
    Apanhei a 2a parte ja depois do penalty e vi ate um soluco no streaming que parou com o Pujol a cortar uma bola e so retomou ja com a bola no fundo da baliza catala...

    Foi mais uma vitoria da "italianizacao" do futebol ingles...

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  2. Espectacular e ver que, ha 3-4 anos, quase toda a gente elogiava unanimemente o Barca...

    Quando o Ronaldo foi para Madrid, os elogios eram mais contidos e repartidos com os merengues. Foi por essa altura que se criou o "duelo" Messi-Ronaldo e as primeiras "chispas" contra a preferencia pelo astro argentino.

    Quando o Mourinho foi para o Real e comecou a disparar contra o Barca e as arbitragens, de repente o Barca passou a ser "Farca" e so vive dos arbitros. O Ronaldo passou a ser indiscutivelmente o melhor do mundo, apenas perdendo para o Messi por causa da UNICEF do aquecimento global e... dos arbitros.

    Nesta semana, o que mais se le/ouve e que afinal aquele futebol que era "empolgante" ja nao o e... bem pelo contrario "da sono"...
    E claro, "E' o fim do ciclo!"!

    Faz-me lembrar um pouco aqueles que em 10 ganham 2... mas esses 2 e' que foram a valer!
    Nao ha pachorra!

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  3. Se me for permitido, gostava de fazer uma rectificação ao texto. O Inter de Mourinho deu um banho de futebol, nos 180 minutos, ao Barcelona.
    "Quando ele vai nú, não usa camisa" - La Palisse.

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  4. O Barça é uma equipa fantástica, mas a este nível não se pode jogar com jogadores r-i-d-i-c-u-l-o-s tipo Tello, Puyol, Cuenca ou Valdes...

    É que com gajos destes em campo fica-se à mercê da sorte e nesta eliminatória foi isso que aconteceu.


    Nenhuma equipa o mundo, por melhor que seja, sobrevive a 2 milagres em 7 dias.

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