Um possível e admitido fracasso português na África do Sul, considerado o difícil grupo saído do sorteio da cidade do Cabo em Dezembro, pode tornar-se hoje, se a Selecção vencer e preferivelmente por mais do que a margem mínima a Coreia do Norte, uma vantagem potencial dos "Navegadores" que resultará no avolumar do rotundo fracasso africano tomando em conta os resultados do contingente de equipas do continente anfitrião. O 3-1 do Brasil, esta noite, frente à Costa do Marfim deixa a equipa de Carlos Queiroz com todas as possibilidades de gerir a diferença de golos que, como se antevia desde a 1ª jornada, poderá ser decisiva e deixa os marfinenses em maus lençóis para a qualificação.
Sem menosprezo pelos modestos mas abnegados, não profissionais (e sabe-se lá que mais vicissitudes particulares...), norte-coreanos que souberam bater-se digna e solidamente frente ao Brasil, não é admissível considerar as possibilidades de apuramento para a fase seguinte a qualquer equipa que não vence os asiáticos "filhos" do sucedâneo do Grande Líder Kim Jong-Il, herdeiro de Kim Il-Sung no fechado país comunista. Portugal viu, hoje, abrirem-se para o jogo de amanhã, as maiores possibilidades de seguir em frente, para o que tem obrigatoriamente de vencer.
Não se antevê, agora, outro cenário - salvo uma catástrofe - que não seja o apuramento de Portugal e tudo porque, também desta vez, a Costa do Marfim deu barraca no seguimento dos fracassos colectivos e de resultados das restantes equipas africanas. O "jogar em casa", ter "o público do seu lado" maioritariamente e outras benesses admitidas em teoria para as equipas africanas resulta, praticamente em termos definitivos, num fracasso como há muito não se imaginava para a aura do futebol daquele continente - idealmente considerado como o que poderia intrometer-se na disputa euro-sul-americana pela supremacia mundial.
E este é o dado mais marcante do Mundial-2010, precisamente por ser "lá", em África, e por todas as expectativas que se acumulavam para as suas equipas mais representativas, às quais faltou apenas o Egipto, ironicamente o campeão continental que em Janeiro se coroou em Angola rei de África e com goleada ao Gana.
Mas é o Gana, de momento, que conta a única vitória africana, quando já equipas credenciadas como Camarões e Nigéria estão praticamente eliminadas, ambas com duas derrotas. Só a Argélia, taída por um frango do seu guardião com a Eslovénia, mostrou brio e equilíbrio, com um bom jogo frente à Inglaterra, num pendor ofensivo e futebol criativo de muitos jogadores virados para a frente. De resto, os "herdeiros" de Madjer ainda podem apurar-se, enquanto a desacreditada Inglaterra precisa só de vencer a Eslovénia para ganhar o seu grupo, ainda que não tenha mostrado futebol para tanto...
O Gana, vencedor da Sérvia e incapaz de bater a Austrália com 10, tem potenciado todas as qualidades intrínsecas do original, criativo e afamado futebol africano: gosto pelo ataque, jogadores virados para a frente, nada de calculismos e, pelo meio, a mostra de um equilíbrio táctico que tem rareado, precisamente, nas outras equipas africanas. De resto, para melhorar ou majorar a sua prestação, os negros da Estrela Solitária contam nas suas fileiras, curiosamente, com vários jogadores que cresceram nas selecções jovens. E curiosamente porque, contrariamente ao desperdício de muitos talentos precoces que se revelaram em Mundiais de limite etário (sub-17 e sub-20), esta equipa conta com alguns jogadores campeões mundiais em 2009 de sub-20 e ainda alguns que vêm de gestas anteriores de outros Mundiais jovens. Um aproveitamento, convém salientar, que faz jus ao trabalho de base que parecia desacreditado por falcatruas nas idades de alguns jogadores. Os ganeses, precisamente, suscitaram muitas dúvidas em várias edições de Mundiais jovens e muitos talentos que se viram rapidamente desapareceram da circulação.
E com um treinador há algum tempo a trabalhar no país, e desconhecido na cena internacional, Rajevac pode igualar o feito do compatriota sérvio Dujkovic, que levou o Gana na estreia mundial aos 1/8 do Alemanha-2006. Desta vez sem poder contar com os afamados Essien e Appiah, lesionados.
Ora, se Costa do Marfim e Nigéria, da África Ocidental como o Gana e os Camarões igualmente decepcionantes, estão em vias de fracassar com estrondo devem-no a treinadores estrangeiros apanhados ao acaso e praticamente de emergência, que não fazem milagres e de cujo temperamento e enquadramento social parece desencontrado com os hábitos locais. Lagerbäck e Eriksson, dois suecos, estão ligados ao decepcionante jogo de nigerianos e marfinenses, comprovando o seu "pé frio" e com redobrado mau jeito de Eriksson, que fracassa por todo o lado onde passa apesar de muito "considerado" por já longínquos episódios de sucesso no Benfica, um deles com quase 30 anos...
Desde a "explosão" africana de 1994 nos EUA, com Nigéria depois repetida em 98, na sequência das proezas dos Camarões em 1990 e Argélia em 1982, a previsão de alguma vez uma equipa africana poder sagrar-se campeã mundial se puder, efectivamente, concretizar-se, ou será pela afirmação plena das potencialidades atléticas e técnicas, sem descaracterizar o jogo visceralmente ofensivo de origem, porventura com um técnico local de alguma destas selecções mais representativas, ou a ilusão de um estrangeiro, talvez europeu, poder dar ordem táctica àquele caos posicional e intermitência psicológica para manter uma justa concentração no campo, será fracassada de vez como agora parece evidente.
E este é o dado essencial a retirar até agora do Mundial estreado em África, onde o árbitro Lannoy, do Brasil-C. Marfim de hoje, mostrou ser tão mau como a selecção francesa em vias de ir para casa sem honra, nem glória e na maior das confusões como habitualmente ocorrem em equipas. africanas onde as estrelas têm um peso decisivo muitas vezes para o pior - quando não pela quase ausência como sucedeu a Eto'o e a Drogba.
Hoje na cidade do Cabo, onde Bartolomeu Dias navegou com toda a esperança e contra o Adamastor, Portugal pode deixar mais um cabo dos trabalhos africanos para trás. Obrigatório bater a Coreia do Norte.
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