Não tem havido muita oportunidade, e tempo, para abordagem de alguns assuntos extra-futebol ou com ele relacionados de alguma forma. Nos últimos dias, porém, têm sucedido coisas importantes, quer para o futebol quer, como extensão da mesma, para a sociedade, a globalização democrática que se vai consolidando e a sociedade da Informação.
Não é bem recriar o cenário da Revolução russa de 1917, como no célebre romance acima ilustrado. Mas têm ocorrido mudanças de sinais contrários aqui e ali que nos devem alertar para o perigo sempre consubstanciado na frase "o mundo está perigoso", seja por que prisma for e pelo motivo mais vulgar e que, de banalizado, nem damos conta.
Com uma pausa no lufa-lufa da Liga, graças a este petisco pré-natalício da Juventude SC de Évora a visitar o Dragão na Taça de Portugal amanhã, é um bom pretexto focalizar a atenção em alguns pontos a que eu sempre dou importância.
Reparei, muitos repararam decerto, o bota-abaixismo com que quiseram condenar publicamente o repórter da TVI Hugo Cadete na entrevista rápida após o Beira-Mar-Benfica. Os talibãs da capital lá se regozijaram com o "então, tchau" do Jesus. No intervalo de longas dissertações sobre verdade desportiva oportunamente desenterrada, entre pulsões de tirar as palhas a Jesus antes do Natal com os desaires da Champions para a qual nem a equipa nem os comentadores encartados têm nível, lá falam, ainda, de liberdade de informação. Li por aí, por portas travessas, inclusive elogio aos "jornalistas" da tv dos bimbos, o que diz bem do nível em que se enquadra esta gente, de rufia de túnel a rato de esgoto.
Hoje o Nobel da Paz foi atribuído, formalmente apesar da ausência física do eleito em Oslo, a Liu Xiaobo, mais um dos históricos condenados por subversão. Apesar das aparências e da periclitante pujança económica, chinesices no pós-modernismo em que a maioria dos Estados se enredou sem assegurar os seus valores próprios na voragem da igualitarização pela via da globalização que faz tábua rasa dos princípios básicos da convivênvia e respeito entre nações, também a China, como o Benfica, retaliando e reprimindo, incentivando boicotes e ameaçando a ordem global contra quem foge do regime controleiro, mostra a sua cara, a de sempre: manipuladora, iludida no seu gigantismo, falsa na proclamação de enunciados éticos e morais. Dezenas de convidados da Academia do Nobel fizeram-se ausentes por "conselho" chinês, o que diz bem do nível de independência e da vontade autónoma de muitos subservientes e assalariados. Eis um exemplo chocante aqui denunciado: http://portugaldospequeninos.blogspot.com/2010/12/face-oculta.html
Sempre no domínio da liberdade de Informação, pilar das democracias e fio condutor potenciado pela internet em que os utilizadores deixam de ser meros receptores e emitem as suas opiniões para todos o lado, o caso da Wikileaks também revela a que ponto chega a tolerância, e a subserviência declarada, a que se remetem os próprios jornalistas. Na tv dos bimbos ou em jornais mais ou menos credíveis e renomados em Portugal, o fenómeno de se encontrar limites para a própria actividade de informar só pode suceder num ambiente de autocensura e é o que tem sido defendido em geral pelas sumidades na matéria cá da paróquia.
Quando o mundo devia rejubilar pela fantástica ocasião de saber coisas classificadas pelos governos como secretas - boas ou más, aquelas que os cidadãos passam a saber que e como se fazem nas suas costas, seja maior ou menos o consentimento e o alheamento dessas matérias -, há talibãs preocupados com as coisas da diplomacia e a cara com que os seus protagonistas ficarão, doravante, a olhar entre si. Como se isso seja muito preocupante.
Há, acima de tudo, um erro de análise que é o de focar na Wikileaks e a organização que a forma. E, contudo, isto só se sabe porque alguém de dentro do sistema, secreto, passa os documentos cá para fora. Julien Assange, agora mais conhecido no mundo por suposta violação de mulheres suecas do que por instigar a divulgação de documentos e posturas institucionais comprometedores, parece o criminoso. E, a montante, há quem propiciou a fuga de informações, o novo "Deep Throat" depois de "Watergate". E, a jusante, os jornais, alguns dos títulos mais renomados no mundo, que publicam os detalhes divulgados pela Wikileaks. Nestes, porém, deve lamentar-se que não tenham deixado de lado algumas considerações pessoais e mesmo de foro íntimo sobre certos líderes políticos. Mas, também, publicar isso ou algo como "Eu, Carolina" vale o que vale e deve dar-se a importância que cada um ache dar.
Por outro lado, há imensas coisas interessantes na forma como os espiões-diplomatas norte-americanos vêem factos e gentes. É esse o seu dever de informar os máximos responsáveis políticos em Washington. Nem lhes levo a mal por isso. Fazem o seu trabalho. Mas o público fica a saber, se nem sequer duvidava que a política e a diplomacia são além de salamaleques e jantares de cerimónia sem ocorrerem crimes para Agatha Cristie ou Poirot investigarem, que Putin ou Obama, e seus discípulos, tratam vizinhos e outra gente como as pessoas no seu dia-a-dia, com desdém ou com admiração, com confiança ou com precauções. Qual a novidade?
E nada como saber que os EUA apontam governadores moçambicanos como traficantes de droga e Estados que se financiam no narcotráfico. Como sempre, acima das preferências de Hillary Clinton, devemos beneficiar do que é mais importante na "comunicação" e relacionamento entre Estados.
Como sempre, Eduardo Cintra Torres, no Público, traça o diagnóstico devido, aqui respigado:
Neste âmbito, a escolha da Rússia e do Qatar para receberem os Mundiais de 2018 e 2022 também diz bem de como certos países/candidaturas derrotados olham para o mundo. Felizmente, esvaziando na hora a total vacuidade da candidatura ibérica, quem pugnou pelo Mundial na Ibéria e no dia da votação lhe tecia os maiores elogios, prognosticando a vitória, a falta de reacções cá revelou bem o empenho, o entusiasmo e a certeza da vitória que se auto-atribuíam. Depois de alguns resmungarem pelos resultados, especialmente os ingleses, mas também os americanos, as melhores revelações vieram a seguir, assente a poeira nascida da contra-informação. Foi o próprio Koloskov, velho dirigente russo com característico aspecto de agente secreto insondável, a confirmar que Putin fez o trabalho "diplomático" que lhe competia. Já afastado do Comité Executivo da FIFA, Koloskov conhecia todos os meandros pelos quais orientou os dirigentes políticos que convenceriam os votantes da razão da renovada candidatura russa. Enquanto os parolos se entretiveram com os 11 fusos horários do imenso país, como se fossem previstos jogos em Vladivostok, no Pacífico, ou na estepe siberiana de Iakutsk onde Abramovich tem um cargo governativo entre renas e abetos, a questão da distância entre as cidades russas para o Mundial não escandaliza quem decerto andou nos EUA-94, com várias horas de avião entre cidades americanas.
Do mesmo modo, ainda que se desconheça que entretenimento, entre música, bebida e bares com álcool à discrição, possa haver para adeptos no Qatar, mas com recurso ao "appeal" dos futurísticos Emiratos ali em frente, o argumento dos 45 ou 50º para jogos em 2022 é estapafúrdio. Primeiro, não é líquido que esse Mundial se jogue em Julho e nem se adivinha que horários fixarão o programa de 64 jogos. Depois, sem evitar-se temperaturas elevadas que prejudicam os jogadores e afectam o espectáculo, há quem esqueça que se jogaram dois Mundiais no México com jogos ao meio dia local. E se 1970 já vai longe e poucos viram menos jogos com 16 finalistas, já Maradona, na era da informação globalizada e tv em todas as partidas, perguntava em 1986 se eram os senhores da FIFA que iriam jogar naquelas condições de extrema exigência física.
Mas não só, ouvir os alemães queixarem-se dos 48º do Qatar em 2022 é perguntar se eles mesmos se lembram da abertura, Alemanha-Bolívia, em Chicago. E, ainda, os espanhóis deveriam recordar, desse dia 17 de Junho de 1994, quantos graus estavam em Dallas no Espanha-Coreia do Sul, o outro jogo do dia, pois constou que eram 44º e ao entardecer. Fora os jogos em Orlando, na húmida Flórida...
É caso para dizer, vão-se catar...
Há apenas um fio condutor em tudo isto: -O dinheiro!
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