05 dezembro 2010

Dar 5-0 não chega, nunca chega para derrotar a estupidificação




Lá como cá, cá como lá, a inversão da prioridade das notícias, o significado e amplitude dos resultados, a supremacia em campo que dura o dia de um score fantástico e uma exibição do outro mundo. O permanente camuflar das incidências. A constante fuga da realidade. A distorção dos factos. A inversão dos valores. O afundamento da credibilidade, seriedade e equilíbrio da Imprensa.
Os 5-0 do clássico de cá foram torpedeados com desculpas tácticas e inundados de posteriores mensagens e alegadas fugas de informação sobre mal-estar no balneário e nos bastidores dos derrotados. As derrotas dos mesmos na estranja são absorvidas com bonomia, enquanto vitórias pujantes dos mesmos vencedores, também lá fora, ocupam cantos quase inexpressivos das capas de jornais da especialidade na chamada Imprensa Destrutiva, como a designo.
Os 5-0 do clássico de lá, que podiam ter sido os 8 a zero que um fanfarrão costumeiro dizia ser impossível de alguém espetar à sua equipa cujo rei vai sempre nu, pensei que poderia contribuir para por cá se reverem no ridículo do seu clubismo perfilhado. Mas não. Uma semana depois, hoje só vi na SIC à hora de almoço o Real Madrid. Os dois golos de Cristiano Ronaldo. Por acaso, ou talvez não, sem aludirem que o Valência cedeu porque já jogava com 10, nunca por os merengues serem melhores e, mesmo com 10, o empate esteve iminente.
Acontece que a jornada deste fim-de-semana em Espanha teve um acontecimento que não se julgaria possível, com a rocambolesca história da viagem do Barcelona a Pamplona, ela sim digna de figurar nas notícias. Durante a semana com o campo coberto de neve, o Osasuna recebia o bicampeão espanhol subitamente afectado pela greve selvagem de que todos ouvimos falar ontem. Sem poder viajar de avião, assim de repente afectado como centenas de milhar de pessoas, o Barcelona quis saber como era. A Liga espanhola, secundada pela Federação espanhola, trataria de mudar o jogo para hoje, domingo, às 5 da tarde. O Barça, que joga 3ª feira para a Champions, nem se importaria. Mas a Federação recuou, diz que nunca sancionou a mudança de data apesar de a ter sugerido. A Liga reconhece que deixou o Barça na expectativa de o jogo ser adiado por um dia. Ambas, porém, sem pedirem opinião ao clube visitado. O Osasuna, com razão, sentiu-se parceiro menor e recusava jogar um dia depois.
Por fim, o Barça lá foi de comboio até Saragoça, a 200 quilómetros, depois de autocarro para mais uns 200 quilómetros. Chegou em cima da hora (às 7 locais) e ganhou por 3-0, com dois golos de Messi depois de Pedro abrir a contagem.
Não, no país que, com Portugal, queria organizar o Mundial-2018, construindo/renovando 13 ou 14 estádios, no país cuja federação tem em Angel Villar o seu presidente com assento no Comité Executivo da FIFA incapaz de confirmar na urna os oito votos que dizia ter assegurados, insuflando de confiança os portugueses que nele confiavam cegamente, fazem isto ao seu campeonato das estrelas, onde estão os melhores jogadores e os clubes mais ricos do mundo.
Mas há mais: soube, estupefacto, que um tal Pedro Mourinho esteve envolvido na apresentação/comunicação da candidatura ibérica. Sem muita atenção, primeiro pensei que era aquele moço que erguem como "famoso" por trabalhar na CNN e de quem não lenbro agora o nome; depois, como acho que os pivots de telejornal pouco mais sabem do que ler o teleponto, porventura com alguma fotogenia e seguramente com dicção superior, pensei que se fosse aquele Mourinho da SIC não entendia a sua elegibilidade, mas para mim nem aquecia nem arrefecia.
Pois foi, ironicamente, esse Pedro Mourinho que nos deu a notícia da vitória do Real Madrid ante o Valência, que eu tinha visto, pela net, na noite anterior. E quanto a futebol estrangeiro, nada mais.
Nada mais? Notícias? Informação? Critério e não sensação?
Deve ser por isso que, em cima de um jogo complicado historicamente - além de ser difícil jogar em Pamplona, nunca o Barça ganhara depois de espetar 5 ou mais no Real Madrid, soube-se pela Imprensa catalã -, provavelmente a melhor equipa de sempre na história do futebol teve uma deslocação atribulada e em risco de falhar a hora do jogo, mas o seu treinador nunca acusou a pressão e saiu-se assim, maravilhosamente bem:
"Sé que no es la noticia de hoy, pero hemos vuelto a jugar maravilloso y hemos conseguido una importantísima victoria"


Esta capa ilustra como, mesmo sem avião, o Barça voou. Voa. Chegou lá à rasca e saiu com 3-0.
Entretanto, todo o mundo parece fazer gozo desse gosto pelo esplêndido futebol do Barça. E, dizem, o mundo do futebol pretende homenagear o seu jogo, os seus artistas, aqueles que nem têm tanta atenção como merecem nem todos os títulos, como em 2009, que não são fáceis de replicar ano a ano.
Consta que, mesmo sem ganhar a Champions, o Barça se prepara para, por força da transplantação do seu futebol, através da maioria dos seus fantásticos entre os melhores jogadores que tem, ocupar o pódio em que assentarão os três melhores jogadores do ano, reunindo agora a antiga Bola de Ouro do France Football com o Wolrd Player of the Year da FIFA. Pelo título mundial da Espanha, claro, e porque o facto de ter perdido para o pior futebol do mundo o ceptro europeu que detinha na sua inolvidável classe e insuperável magia (2-0 ao M. United em Roma, em 2009), não negam ao Barça o que merece. Respeito e admiração.
Enquanto a SIC, o Mourinho apresentador e outros bimbos insistem em babarem-se com Cristiano Ronaldo, como no antigamente em que as notícias eram seleccionadas para o bem-estar e a propagação dos valores portugueses entre o "Deus, Pátria e Família", a par do "Fado, Futebol e Fátima, fica algo indiferente para quem gosta de futebol e vê para lá de Badajoz e por cima de Madrid que, segundo a Gazzetta dello Sport, hoje, será Iniesta e não Xavi eleito o melhor jogador do ano. Sem tatuagens, sem golpes publicitários, sem companhias de passerela nem pormenores íntimos e enganos perfilhados na virilidade muito portuguesa, nem peitorais e abdominais que de repente também transformaram o jogador Beckham no modelo Beckham e servem para Cristiano Ronaldo vender cuecas, máquinas de barbear e champôs.
Para cúmulo, sea como sea entre Iniesta e Xavi, jogadores modelares e cidadãos exemplares, ser Messi, mesmo "perdido" no Mundial entre os vários delírios argentinos de Maradona, a ocupar a terceira vaga e não Cristiano Ronaldo deve fazer muito mal a certos egos portugueses.
Um deles será, não Mourinho, o fantástico Zé treinador capaz de coleccionar tantos títulos como insultos por mau carácter (o último ontem mesmo, da parte do treinador valenciano na sala de Imprensa depois da meia-noite em Madrid...), mas o extraordinário Wesley Sneijder em que só o facto de perder o Mundial pela Holanda o transforma, injustamente, num eventual perdedor, que não merece.
Sneijder pode ficar a saber que mesmo ganhando por 5-0 nem sempre se é o melhor. Bastou-lhe ganhar a Champions à custa do pior futebol possível para superar o Barça, aquele glorificado, estupidamente, pelos mestres da táctica ululantes na idiosincrasia tuga capaz de relativizar um 5-0 no campo e exaltar, ao invés, um triunfo na sala de Imprensa por Mourinho, após a catástrofe, lembrar quem foi o campeão europeu à frente do majestático Barcelona.
Se Sneijder perder para os três reis magos de blau-grana, perceberá como se relativizam as coisas. Ganhe-se Liga e Taça de Itália e Champions, além de um meritório 2º lugar no Mundial da FIFA. Ganhe-se 5-0 no clássico de Portugal ou 5-0 no de Espanha.
Não parece fazer sentido, contudo faz bem de conta que é a realidade. Pelo menos a que nos impingem, ainda que em Portugal, muito dado a fachadas e folclores, certas pitonisas confirmem como mais vale cair em graça do que ser engraçado.
Nunca discutir com um idiota, porque é cair no nível dele e onde nos derrota facilmente, torna-se uma precaução sábia em modo de vida no que toca a Informação em Portugal.
Apresentam agora que Cristiano Ronaldo tem 17 golos em 14 jornadas o que é histórico... no Real Madrid. Respiga-se da Marca, que fala dessa marca insuperada desde 1935-36. Curiosamente, deve ter havido um herói maior no clube merengue, mas nem a Marca o designa. Ao invés, quando descobrimos que há mundo para além do que alcançamos, relata-se que um tal César fez 20 golos em 14 jornadas em 1950-51. Deixa lá, foi pelo Barcelona...
Pois é, ficamos sempre a perder. Com idiotas, não há hipóteses. E a estupidificação extensiva, progressiva, agressiva ganha terreno. Não sei se chegaremos a algum lado. Pelo menos chegamos aqui...
p.s. - vi esta noite o TJ da TVI, ao menos deram o resultado do Barça...

9 comentários:

  1. Meu caro :

    ..."Nunca discutir com um idiota, porque é cair no nível dele e onde nos derrota facilmente, torna-se uma precaução sábia em modo de vida no que toca a Informação em Portugal"...


    Tens toda a razão!

    Um abraço

    ResponderEliminar
  2. Zé Luis,

    Ainda hoje, ao ver os Telejornais da RTP em que rejubilavam com o bis do Reinaldo, me recordava dos vários posts que vens escrevendo sobre esse assunto e pensava no quão acertada é a tua escrita...

    Tivemos uma semana de pausa da Reinaldomania...

    ResponderEliminar
  3. Estive a acompanhar os 2 jogos de La Liga, também pela net, e que prazer deu mais uma vez ver o Barça a jogar, com cerca de 70% de posse de bola, sempre em busca do golo e com toques de génio de vários jogadores - o passe de Busquets para Messi na jogada do 1º golo é espectacular - por outro lado no jogo do clube do regime é impressionante a semelhança do "lá como cá". Depois do 5-0 (faltaram 3 para calar o palhaço da madeira junior - e se não fosse o Zé Luis já nem me lembrava dessa) eles tremeram tanto e estiveram tão inseguros e só depois de um equivoco do arbitro a reduzir o Valencia a 10 conseguiram marcar... ainda cheguei a gritar golo do Valencia mas a bola foi desviada quase na linha de baliza e depois lá veio o 2-0, numa jogada com (muito pouca) oposição do pior central que alguma vez vi jogar no meu clube - Ricardo Costa.

    Hoje nos noticiarios tambem reparei na dualidade de criterios e omissão do jogo do Barça, enfim...

    ResponderEliminar
  4. Para os convencer, teríamos de jogar com eles todas as semanas, durante dez anos e ganhar-lhes 90 % dos jogos...Mesmo assim, eu duvido...

    ResponderEliminar
  5. Meus amigos,

    acho que o Guardiola resume tudo mito bem e eu destaquei-o por isso:

    "Sei que não é a notícia de hoje".

    É como quando o FC Porto ganha, porque só quando perde ou empata é que tem destaques...

    ResponderEliminar
  6. Saudações!

    ..."Nunca discutir com um idiota, porque é cair no nível dele e onde nos derrota facilmente, torna-se uma precaução sábia em modo de vida no que toca a Informação em Portugal"...

    Sublinho!

    ResponderEliminar
  7. Para quem quiser fazer o download para ver, rever e guardar o 5-0 de Camp Nou, deixo aqui a ligação para o torrent:

    http://extratorrent.com/torrent/2336586/La.Liga.Barcelona.vs.Real.Madrid.Full.Match.Sky.Sports.29.11.10.html

    ResponderEliminar
  8. Tens razão em tudo até ao ponto em que relativizas a vitória do inter sobre o Barcelona... não é relativa, não é simplista, é um enormíssimo golpe de génio conseguido, graças a Deus ou a quem comande este universo, por um português. Não lhe refiro o nome porque nao há necessidade, mas como venho a dizer há muito,até Guardiola fazer o mesmo num outro clube não passa de um treinador banal aos meus olhos.

    ResponderEliminar
  9. Pudget, tivesse o árbitro validado um golo a Bojan no último minuto e veria muitos mais do que alguns cínicos a criticar o futebol do Inter para perder por poucos.

    Deve ser por isso, de resto, que sucede a exclusão, não do CR7 que não justificava mais, mas de Sneijder, que foi brilhante no Inter, esse sim.

    Aqui: http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Desporto/Interior.aspx?content_id=1728417

    ResponderEliminar