07 outubro 2006

Das promiscuidades silenciadas

«Como o leitor muito bem sabe, a comunicação social, particularmente a televisão, é useira e vezeira em campanhas contra políticos e autarquias que se relacionem com clubes de futebol. As aproximações e colaborações são, por via de regra, vistas como perigosa e inaceitável «promiscuidade». A sanha persecutória é de tal ordem que até parece que o futebol é causador de uma lepra que mina irremediavelmente os fundamentos da democracia e do regular e sadio funcionamento da sociedade.
Claro que há algum exagero neste meu reparo; e não é bem assim. De facto os media não visam todas as autarquias, todos os políticos e todos os clubes por igual. A acusação de «promiscuidade» e de esbulho do erário público tem destinatários privilegiados. Se em causa estiver uma autarquia e um clube da «província» ou o governo e os clubes da Região Autónoma da Madeira, é certo e sabido que a acusação atinge o espírito de cruzada. Pelo contrário, ela nunca se aplica aos clubes da capital e à respectiva autarquia. Neste caso, não apenas fica de fora a acusação de «promiscuidade», como são escondidos da opinião pública os montantes dos apoios e benefícios concedidos. O que se passou, há tempos, com a construção dos estádios constitui prova irrefutável do que acabo de afirmar; a dualidade e a parcialidade de tratamento do assunto pelos media foram por de mais manifestas.
Não, não estou a mexer no passado. Estou a referir-me a coisas muito graves do presente e à demissão da comunicação social de exercer a função da crítica, denúncia e questionamento. Vou ser mais explícito. Imaginemos que a Caixa Geral de Depósitos apoiava a construção de instalações do Futebol Clube do Porto, para não falar noutro clube longe da capital. Certamente se levantaria no panorama mediático um coro inflamado de suspeitas, protestos e condenações que fariam cair a Torre dos Clérigos e os responsáveis pelo apoio concedido. Alguém tem dúvidas de que seria assim?
Todavia o caso ocorreu, só que com um clube da capital; e sobre ele não se levantou a mais pequena pergunta. Ninguém questionou os critérios que levaram a CGD a praticar tal colaboração. Ninguém se preocupou com a legitimidade da operação. Ninguém perguntou que tipo de negócio e investimento é esse. Ninguém se interrogou acerca das motivações dos administradores da Caixa. Ninguém quis saber se isso é benéfico ou lesivo dos contribuintes para a dita instituição. Ninguém rotulou de «promiscuidade» intolerável aquele casamento de interesses nada transparentes.
Não sei se o apoio da CGD é ou não plausível no plano jurídico e financeiro, tendo em vista a defesa dos sagrados direitos dos seus contribuintes. Mas gostava de saber; mais, todos temos o inalienável direito de conhecer a verdade, o alcance e a justificação da operação em causa. E a comunicação social tinha e tem o dever de questionar, de não se calar, de não se remeter a um silêncio envergonhado e de nos informar com rigor, responsabilidade e clareza. Porém até agora optou por colaborar no encobrimento de uma situação que se apresenta — ela sim! — com contornos de uma promiscuidade abusiva e perversa.
Não escapa a ninguém que no País, tal como no Mundo, imperam lobbies e organizações, pouco propensos a dar a cara à luz do dia. Igualmente é conhecida a existência de duas grandes organizações, uma de ordem religiosa e outra de matriz laica, que têm forte presença na cena nacional e nela exercem uma influência impossível de negar. Contudo pouca gente se apercebe de que há uma terceira força com evidente capacidade de manobra nos areópagos do poder. É ligada a um clube de futebol que tem gozado e goza de impunidade, proteccionismo e cobertura crescentes. Por este andar, é plausível supor que, dentro em breve, será vedado o desempenho de funções públicas de relevo a todo aquele que não se identifique com essa força e que denuncie os favores activos e passivos de que é beneficiária. Afinal, o sol quando nasce não é para todos.»
Jorge O. Bento - Um olhar do norte - In A Bola

4 comentários:

  1. Finalmente vejo alguma coisa de jeito a sair dum jornal como A Bola...

    Mas isto não é caso único. São parcerias com a CGD, são as formações de raiz da Liga, são as afirmações de «prefiro ganhar lugares na Liga» que não são investigadas, são os casos dos jogos no Algarve e das botas vermelhas do árbitro do jogo com o Estoril, é agora o Apito Dourado que derepente ao englobar escutas ao Filipe Vieira foi menos mediatizado, é o caso das contas congeladas do Alverca porque um senhor meteu dinheiro ao bolso à custa de empresas fictícias, é a bancarrota do Estoril porque outro senhor só lucrou com isso, é o financiamento do Estádio da Luz, é a promiscuidade dos passes dos jogadores como o Simão, Luisão e outros pertencerem à Somague para saldar dívidas do Estádio da Luz e do Centro de Estágio (porque acham que o homem pede sempre 20 milhoes? Para sobrar algum para o Benfica). Enfim, é tanta a porcaria, que as instâncias da justiça portuguesa não devem ver por onde começar (digo eu na minha inocência). Isto é uma vergonha! Quando se falou que o Pinto da Costa aparecia em escutas telefónicas foi logo um escândalo, páginas de jornais, abertura de telejornais, já era execução pública. No dia do Porto x Chelsea deu-se mais ênfase ao facto do Pinto da Costa ter sido interrogado que a vitória exemplar do FCP. Por isso eu digo, que o Pinto da Costa com tantos inimigos que tem, se fizesse coisas como andam a fazer estas duas meninas que agora querem justiça, mas sem que a justiça lhes faça mexer os cordelinhos das contas na Suíça e das acções em clubes pequenos, já estava bem enterrado. Felizmente, temos um presidente firme e de mãos limpas, não é como esses 2 que andaram a enterrar o Alverca e o Estoril para o passado deles também ser enterrado. Que andam de mãos e pés atados se alguma coisa salta cá para fora, que têm um rabo de palha e que se começa uma ponta a faiscar, arde tudo. ISTO É UMA VERGONHA E NINGUÉM LHES PÕE A MÃO!


    Outra coisa totalmente distinta, Zirtaev, vais criar uma Liga no Fantasy Football para a Taça Uefa? È que dou prioridade a ficar na mesma liga que na Liga dos Campeões. Abraço

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  2. Eskeci-me também de deixar um grande abraço e um grande obrigado ao Jorge Costa por tudo o que ele fez pelo nosso clube. Jorge Costa renunciou aos relvados na quinta-feira. OBRIGADO CAPITÃO

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  3. à excepção das crónicas do meu miguel (sim, isto é só intimidades:)), raramente páro n'a bola. terei de parar, a partir de hoje. este cronista, que me era desconhecido, vale a pena...:)

    PS: estou aqui. estou bem. fim de semana agitado:)

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  4. Pedroz, todos os assuntos de que falas não dariam só um post, mas sim um blog inteiro...

    Quanto à liga da UEFA em princípio não a criarei. A UEFA, acho que para mim e para a maior parte, não tem o mesmo interesse que a CL, além que muitos clubes nem os conhecemos bem, assim como os jogadores. Não desperta mesmo nenhum interesse. Desculpa se te decepcionei e a outros.

    Catarina, comigo estás sempre a aprender. LOL
    Mas de qq maneira esses dois cronistas são mesmo as únicas razões para parar no "esférico".

    Um abraço.

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