07 novembro 2013

Os números não traduzem o que é o futebol

 
Vejam-se as diferenças de tratamento informativo sobre o desemprego, o PIB ou outra equação racional qualquer, a cargo de "defensores" e "detractores". Quando o desemprego subia meses e meses, anos até, era o descalabro para os "detractores", indiferentes às causas estruturais e ao declínio já de há muito assinalado e que só podia, inexoravelmente, conduzir ao agravamento da situação. Idem com o PIB, idem com a dívida, idem com o défice.
 
O tratamento que o Littbarski ali deu no 4x4x2 é desastrado. Os números são iguais, mas a realidade que lhes subjaz é diferente. Paulo Fonseca tem os mesmos números de Vítor Pereira por esta altura na sua primeira época. Já se tinha percebido, para quem segue estas coisas de cor e salteado. Mas a herança de cada um foi bem diversa, VP herdou uma equipa que ganhara tudo mas perdera Falcao e estava na iminência, como sucedeu, de perder vários jogadores muito influentes, pelo descontentamento militante que levou à sua saída em Janeiro de 2012. Paulo Fonseca descaracterizou o futebol portista, desorganizou a equipa com rotinas estranhas, desarranjou tudo em nome de tudo se encaixar na sua forma de "jogar".
 
Pode-se usar os números para comparar e igualar proezas, sem dúvida, mas não se extrai dali mais nada, nem qualidade de jogo nem sequer melhores expectativas para o futuro, a perspectiva de as coisas serem cada vez melhores e prometerem títulos e conquistas, nem que sejam apenas conquistar o coração dos adeptos.
 
Esta conclusão pode ser fria nos número mas esconde as dificuldades sentidas pelos dois treinadores. E Paulo Fonseca tem sentido dificuldades mais por culpa própria do que por culpa dos jogadores. Até agora só teve o problema de Fucile se revelar, o que para VP sucedeu mais tarde mas em catadupa, com Beluschi, Guarín, Álvaro Pereira.
 
Uma pessoa honesta até poderia dizer que, nesta altura, VP nem sequer tinha ganho ao Sporting na sua primeira época, coisa que PF já fez. Mas Jackson, na sua estreia na Europa ainda que fosse a 2ª época de VP mesmo que já sem Hulk, era o rei dos golos e hoje não vê jogo algum à sua frente para poder marcar.
 
Vítor Pereira, o desastrado bicampeão, a quem poupei na eliminação da Taça em Coimbra e culpei pela eliminação da Taça em Braga na época seguinte, até foi o nabo que por duas vezes em vantagem em casa se deixou empatar com o Benfica. Paulo Fonseca por duas vezes em vantagem deixou-se empatar com o Estoril e infamemente prejudicado o FC Porto por uma arbitragem inqualificável.
 
Mas com Vítor Pereira assentava uma ideia de jogo hoje inexistente, mesmo na turbulência do balneário dos amotinados (sem culpa do treinador). Hoje não há ideia de jogo e não há jogos bem conseguidos, tirando os três primeiros da época.
 
Como é que o FC Porto começou bem a época e depois passou a arrastar os pés? Os mal intencionados podem culpar Vítor Pereira pela herança de um futebol equilibrado e objectivo, massacrante na posse e desarmante a retirar ao adversário hipóteses de atacar.
 
Por mim, que vejo os números mas interpreto-os com a realidade e onde os resultados não influenciam, quantitativamente, a análise qualitativa ao futebol praticado e à confiança induzida pela segurança posta em campo, continuo mais à vontade do que o Littbarski para ver o jogo e temer pelo pior.
 
Desde o início da época apontei os problemas que Paulo Fonseca iria trazer com o 4x2x3x1 que eu raramente vi em campo e que agora alguns vão interpretando como um 4x3x3 envergonhado por não termos os extremos necessários e as escolhas serem pouco partilhadas quanto aos recursos utilizados. E sucessivamente elenquei os problemas que os jogos vinham a colocar: em Viena, apesar da vitória, antevi que o FC Porto assim não chegaria mais longe do que a Liga Europa; e no Estoril, passando por cima dos erros de arbitragem, percebi que não temos treinador, o que se vem verificando em cada jogo pela sua inabilidade no banco, a inacção a antecipar os problemas dos jogos e a péssima capacidade de transmitir confiança e força nas conferências de Imprensa - algo que muito se criticava a VP mas quem o fazia tinha o contraponto da excelência, imbatível, de AVB, com quem era pesado fazer comparação. É pena que não se entretenham a verificar os "dieres" de PF e de VP.
 
Portanto, para mim os números dizem pouco e escondem muito. Já falar quando se ganha apontando o que está mal tem sido difícil, para o Littbarski e para a bluegosfera em geral.
 
Por mim, continuo à espera de, no final da época, poder felicitar Paulo Fonseca se conquistar o título. Mesmo que, ao contrário dos últimos anos, agora eu tema que perderemos fácil com o Benfica e que não acabaremos o campeonato sem derrotas. Não tenho confiança no treinador e não vejo melhorias na equipa, bem pelo contrário. Mas tudo isto vai além da capacidade analítica que não é, necessariamente, algo que se traduza dos números em si. Perspicácia e perspectiva são coisas em falta a Paulo Fonseca e contagiam quem lhe queira fazer a corte. Só espero que tenha sorte e comece já em Guimarães.
 
Creio estarmos na fase do "like" ou "dislike", como já disse, própria do Facebook, a que aliás não adiro. Nos últimos anos havia quem não gostasse do futebol do Barcelona, aliás seguido no Dragão com AVB e VP. O futebol passou a ser, lamentavelmente, uma questão de gosto, discutível por natureza, tal como uma cor, um vinho ou uma fatiota. Os que assim pensam extraem dele o mínimo.
 
Ainda agora, o excelente Jurgen Klopp disse desgostar do futebol do Barça, aludindo a que preferiria seguir o ténis se em miúdo tivesse sido influenciado a ver futebol como o do Barça. Pois eu em miúdo vi futebol muito diverso do de hoje, cresci com o Ajax do "total voetbal" de Cruijff, apreciei o contra-ataque do Liverpool, depois a máquina milanesa de Sacchi e o consecutivo delírio do Milan de Capello, a emergência do Real Madrid da Quinta del Buitre apesar de não ser campeão europeu, e o jogo estereotipado de várias equipas já este século. Até à soberba incomparável do Barcelona de Guardiola, a mais majestática de todas as grandes equipas da história do futebol que me foi dado ver em 40 anos.
 
Pois ainda ontem vi o Barça ao nível do seu melhor tempo recente, ainda que visse o Real Madrid mais forte e convicto no recente clássico em que achei injusta a sua derrota. E Klopp para já segue em 3º lugar no seu grupo da Champions. Os gostos não se discutem, repito, mas os números também não dão as emoções, as evoluções e as transformações do futebol.

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