12 dezembro 2009

Efeméride(s) de Pavão (pelo V. Setúbal) ao Japão (duas vezes)









As vitórias da Taça Intercontinental de 1987 e 2004 e o minuto 13 da 13ª jornada com o V. Setúbal (a 16/12/1973)

Cumprem-se hoje 5 anos da vitória do FC Porto, em Yokohama, na última edição da Taça Intercontinental. Foi por grandes penalidades frente ao Once Caldas, da Colômbia, depois de 0-0 em 120 minutos porque um fiscal-de-linha sul-americano parecia o Ramalho a levar um cachaço na Luz e negou dois golos a McCarthy por fora-de-jogo, inexistente nos dois lances que teriam evitado até o prolongamento.

Este jogo foi a um domingo de manhã, pelas 10h em Portugal continental, 20 horas na grande metrópole nipónica de Tóquio e arredores. Foi a 12/12/2004. Que diferença para o 13/12/1987, quando a hora do jogo com o Peñarol de Montevideu foi pelas 12.30 horas locais e 3.30 horas por cá, uma madrugada de domingo, no então Estádio Nacional de Tóquio, onde desde 1980 as finais passaram a disputar-se num jogo só (em vez de duas mãos entre os campeões europeu e sul-americano desde os anos 60 salvo raras excepções que fizeram três jogos com a finalíssima).

Amanhã faz, então, 22 anos dos golos de Gomes e Madjer sob a neve de Tóquio e um lamaçal como nunca se viu numa final. O relvado parecia palha, fruto de um jogo de râguebi disputado dias antes e agravado com um nevão como há muito não se via na capital japonesa e de resto nunca mais voltou a suceder nas finais em Tóquio. Foi, por isso, um fenómeno climatérico único, circunstancial, mas que obrigou as duas equipas a jogarem em condições indignas, sem possibilidade de voltarem a cruzar mundo para se reencontrarem ali posteriormente. Foi jogar de qualquer maneira e, ainda assim, para ver mais uma magia de Madjer, a picar a bola sobre o bigodaço g.r. uruguaio Pereyra numa equipa então dirigida por Óscar Tabarez que hoje comanda a “Celeste” de Rodriguez, Fucile e Álvaro Pereira.

Mas este domingo traz o V. Setúbal ao Dragão, à 13ª jornada da I Liga. E foi ao minuto 13, de um Porto-Setúbal da 13ª jornada de 1973, que Pavão morreu. Por acaso, o jogo foi no domingo 16 de Dezembro, mas a coincidência de os sadinos voltarem ao Porto à 13ª jornada, como há 36 anos, evoca fatalmente o acontecimento que enlutou o futebol português.

Naquele tempo já eu, miúdo, andava pelas Antas havia um ano e picos. Gomes via-o já nos juniores e só começaria a jogar nos seniores na época 74-75 (vi o seu bis à CUF na 1ª jornada), dentro de um ano e meio. Oliveira já era um senhor, tal como Pavão, o Fernando Pascoal das Neves, de Chaves e que abrira um bar no Porto com o nome inglês Peacock da alcunha porque era conhecido no futebol.

Nunca se apurou ao certo a causa da morte de Pavão. Então alvitrou-se uma doença congénita do coração, que devia interditar a prática desportiva a um tipo atarracado, forte, humilde e tecnicamente bravo. Palpitou que um cabeceamento aos 11 minutos pudesse ter apressado uma embolia cerebral, mas a verdade é que eu vi Pavão passar a bola, sozinho, e cair para o relvado: “Pavão fez um passe e depois morreu”, titulou o JN. Simples e real, mas doloroso. Naquela tarde cinzenta e chuvosa, quando todos os jogos eram às 15 horas, o Porto venceria por 2-0 a equipa portuguesa que eu então admirava: o V. Setúbal, sob o comando de Pedroto, jogava um futebol brilhante, com médios e avançados de categoria ímpar: Octávio, José Maria, Matine, Duda, Jacinto João e Torres, o bom gigante que se transferira do Benfica.

Octávio e Duda jogariam depois, com enorme sucesso, no FC Porto, artífices do fim do jejum em 1977 (Taça) e 1978 e 79 (dois campeonatos). Duda, em 73-74, levava 16 golos em 12 jornadas e marcara, na 4ª feira anterior, precisamente a 13 de Dezembro, um golo ao Leeds United. Os sadinos eliminaram da Taça UEFA os gigantes ingleses com 3-1 no Bonfim. O Leeds foi a primeira grande equipa inglesa que eu vi jogar, nas finais da Taça de Inglaterra. E na época seguinte 74-75 chegou mesmo à final de Paris da Taça dos Campeões, perdendo injustamente com o Bayern de Munique (0-2) depois de um golo mal anulado a Lorimer. Eu sabia tanto o onze do Setúbal como o do Leeds também comandado por um génio (Don Revie). Eu encantei-me com o futebol sadino em épicas pelejas na Taça UEFA com os potentados do Tottenham, Leeds (duas vezes), Hertha de Berlim (eliminação estúpida com 2-2 depois de chegar a 2-0 na fase seguinte).

O Setúbal era, pois, um cartaz naquele tempo. Liderava o campeonato, mas nesse jogo nas Antas perdeu com golos de Abel (53) e Marco Aurélio (68), o Sporting de Yazalde igualou os sadinos no comando e o FC Porto, à 13ª jornada, ainda distava 3 pontos dos líderes. Curiosamente, tal como nesta 13ª ronda de 2009-2010, também o Benfica defrontou então o Olhanense, como sucede neste sábado, vencendo por 4-1 na Luz. O ano de 1973, de resto, terminaria com a 15ª jornada a 30/12 e com o Setúbal a obter na Luz uma raríssima vitória, por 3-2, chegando a 3-0 para sentir a reacção encarnada a reduzir o marcador nos últimos 5 minutos. O Sporting terminou a 1ª volta na frente do Setúbal por um ponto e do Porto por 3 pontos, com o tricampeão Benfica em 4º lugar após 0-0 no Barreirense; e acabaria, o Sporting, campeão, apesar de perder duas vezes com o Benfica; e Yazalde foi o maior dos marcadores de sempre com 46 golos.

No Porto-Setúbal, porém, a notícia que marcou o dia foi a morte de Pavão. Caiu fulminado aos 13 minutos, depois Vieira Nunes substituiu-o. Durante o jogo, aguardavam-se notícias do Hospital de S. João, cresceu a especulação e a vitória foi das mais tristes da história do FC Porto. Cerca de 55 mil pessoas haviam deixado 110 contos na bilheteira, segundo o JN.

Da Pavão ao Japão, este fim-de-semana evoca memórias. Mas ao lembrar estas efemérides, aponto que quando o FC Porto jogou em Tóquio, em 1987, nem nesse dia 13 nem no dia 16 em que era devido lembrar Pavão a sua triste sina foi publicitada.

Para o Porto-Penãrol, de 1987, cujo programa do jogo guardo por um amigo mo ter trazido, o que se evocou foi a final da Intercontinental de 25 anos antes. O Santos tinha espetado uma goleada ao Benfica na Luz. Com Pele (3), Coutinho e Pepe, os brasileiros ganharam 5-2 (chegaram a 5-0), depois de 3-2 no Rio de Janeiro, no Maracanã. Pepe, em 1987, estava no Porto, treinava o Boavista. E falou de uma das noites mais memoráveis do Santos contra a já então afamada bazófia benfiquista que pensava ganhar a Pele e Cª. Dois anos antes, o Benfica levara 5-0 do Peñarol em Montevideu, na primeira edição da prova, mas é lendária a ideia benfiquista de ser maior do mundo e arredores…

Curioso ainda, sobre Tóquio-1987, um tal de Pinto de Sousa afirmar, no Japão: “Achei que devia estar alguém ligado à FPF em mais um momento de afirmação internacional de um clube português”.

O prémio da organização de 1987 foi de 25 mil contos para o vencedor. Não deu para pagar aos jogadores e técnicos. Soube-o, muitos anos depois, por um dos intervenientes portistas, que Viena rendeu 1500 contos a cada jogador, Tóquio mil contos e a Supertaça da Europa que se seguiria, em Janeiro de 1988, com o Ajax, “apenas” 750 contos.

Dinheiro de outros tempos, como de outro tempo era, então, Pavão.

Em finais de 1973, o FC Porto cobiçava um genial nº 10 peruano que se distinguiu no México-70 (segundo melhor marcador atrás do inevitável alemão Gerd Müller). Cubillas, porém, custava uma pipa de massa e justificaria a mais cara contratação de sempre de um clube português, para a qual o FC Porto teve de fazer uma colecta pública até obter os 5600 contos necessários para resgatar Teófilo Cubillas aos suíços do Basileia, onde não se adaptara.

Um dia depois da morte de Pavão, o repórter do JN António Matos, depois falecido igualmente, revelou passagens não publicadas da última entrevista de Pavão, dias antes, ao diário portuense. Pavão, contou o jornalista, criticava as opiniões da Imprensa de forma frontal, mas era um puro e um senhor, comportando-se civilizadamente e comprovando o seu amor ao clube, no tempo de jogar com amor à camisola.

“Não escreva isso (que adorava o FC Porto e sofria com as críticas nos tempos de jejum de êxitos), pois as pessoas pensam que nós só actuamos por dinheiro e a nossa devoção é uma vigarice. E não ponha isso dos 10 contos para o Cubillas, hein?”, recordou António Matos sobre as palavras de Pavão que não escrevera em vida e não hesitou em publicar após a morte de um campeão sem título levado pelo infortúnio da morte.

Foi ao minuto 13, da 13ª jornada numa visita do Setúbal. Pavão teve um busto nas Antas, como depois teve Rui Filipe (vítima de acidente de viação aquele que marcou o 1º golo do que se tornou a Saga do Penta). Mas poucas vezes mais foi lembrado e amanhã podia ser uma boa ocasião. Faz 36 anos da sua morte no próximo dia 16, mas a coincidência de serem os sadinos nesta ronda a jogar no Porto justificava-o este domingo.

4 comentários:

  1. Bom post,rico de evocações.
    Permita-se apenas umacorrecção: Onde está «...o Fernando Pascoal das Neves, de Amarante...», haverá lapso, pois o Pavão era de Chaves.
    Quanto ao resto, concordo plenamente.

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  2. Tem razão, erro meu, está corrigido. Obrigado.

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  3. Querido Pai Natal PINTO DA COSTA

    Sei que sou um menino mimado e privilegiado.

    Nunca me faltaste com nada ao longo de tantos e felizes anos. Sei também, que as minhas e as da minha família, são também as tuas alegrias. Reconheço todo o teu esforço, empenho e dedicação na hora de nos compensares pelo nosso bom comportamento (estações de serviço são outro assunto – uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa).

    No último ano, procurei portar-me bem como aliás faço sempre, na expectativa de continuar a merecer a tua recompensa. Sim, sei que nem eu nem ninguém da minha família tem mais espaço em quartos, paredes, armários ou prateleiras para guardar tantas lembranças. Lembranças tão grandes que nem os outros – os que não se portam tão bem – são capazes de esquecer por um momento que seja. Lembro-me de viagens por toda a Europa e até pelo Japão… enfim, o convívio com as outras 7 grandes famílias Europeias, com quem temos passado o Natal nos últimos 4 anos!

    Mesmo assim e porque nos habituaste a esta felicidade constante, dou por mim a escrever-te em mais este Natal.

    Sei que a tua vida nem sempre é fácil. Há para aí 6 milhões de pessoas, que não tiram os olhos de ti. Mesmo sabendo do teu carácter e da tua fidelidade, esperam milagres que, quando não chegam, tentam alcançar através de valores tão mesquinhos como o ciúme, a inveja e o olho grande.

    Eu sei que sou mimado, mas não sou chorão e entendo que é difícil receber mais do que o que já tenho!

    Sendo assim, só me lembro de uma coisa pequenina; algo que já tive muitas vezes e que gozei até à exaustão, mas como sabes, há vícios que não são prejudiciais e sabem tão bem!

    Tenho ouvido falar numa lenda, mito ou estória intitulada «Exterminador Implacável». Os crentes juram pelo filho de Deus que existe, os cépticos asseguram que já viram «este filme» e que a cena final é sempre dramática (como uma novela argentina) para os que acreditam.

    Como nunca fui crente, peço-te que no próximo dia 20 me dês só mais um sinal da tua real existência!!!

    Muito obrigada pela atenção dispensada nesta carta e pelas 3 Flores que depositamos na campa do saudoso Simulão em Madrid!

    Muitos beijinhos e votos de um Feliz Natal.

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  4. Obrigado por mais um excelente texto.
    Eu já ouvi por várias vezes os acontecimentos nessa tarde do jogo contra o Setúbal, pois o meu pai era um dos que estava nas bancadas das Antas. Gostei mesmo muito deste relato, com bastante mais "sumo" que a versão do meu velhote.

    Obrigado Zé Luís
    Saudações portistas

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