11 junho 2014

Há 36 anos o jejum terminou a um domingo

A 11 de Junho de 1978, finalmente, o FC Porto ganhou o campeonato que lhe fugia desde 1959. Este dificilmente é lembrado pela parte do treinador, mesmo que no FC Porto tenha sido o caso de uma troca de técnico a meio da época ter propiciado o título, com Bella Guttmann; ao invés, foi o campeonato decidido por um golo, apesar de muitas vicissitudes: as tropelias do Benfica que levaram o seu treinador-adjunto a sentar-se no banco do Torreense com quem o FC Porto jogou na última jornada; os golos facilitados pelo g.r. Gama, da CUF, que motivaram os seus colegas a pedir a sua substituição; os penáltis concedidos (3) pelo famoso árbitro Calabote; e os 7-1 do Benfica que não chegaram para forçar o jogo de desempate porque o FC Porto ganhou 3-0 em Torres Vedras, com um golo no último minuto; mais a espera de quase 15 minutos após o termo do encontro do FC Porto e o da Luz. Por uma diferença de um golo o FC Porto foi campeão.
 
Não, 19 anos depois, o FC Porto marcava carradas de golos. Foram 81 em 30 jogos e daí para cá não houve média de golos mais alta para um campeão, quase 3 por jogo. Nesse tórrido domingo de 1978 fiz fila nas Antas a partir da 1 da tarde, comeu-se o farnel no estádio e passámos 5 horas ao sol escaldante, o jogo apenas começava às 17h. O Braga acabou despachado com 4-0 e os três empates anteriores pouca mossa fizeram a não ser deixar o Benfica empatar em pontos no final e acabar em 2º lugar sem ter perdido um jogo. O FC Porto fizera 0-0 na Luz, depois 1-1 em casa na antepenúltima jornada, entre os dois 0-0 de Portimão e de Coimbra, o golo de Ademir tornando-se um dos mais dramáticos de sempre, aos 83 minutos, desse 28 de Maio que deixou o FC Porto ainda 1 ponto à frente do Benfica, depois foi à Académica e terminou com o Braga.
 
Em 78 o Mundial na Argentina caminhava para o fim: começara no início do mês e faltava uma semana para a final de Buenos Aires onde era previsível que a Holanda, sem Cruijff, jogasse, enquanto Argentina e Brasil disputaram a vaga até à última jornada da segunda fase de grupos, aquela em que o Peru levou 6-0 de Kempes e C.ª e por diferença de golos os azuis e brancos, em loucos ambientes de festa apesar da tristeza vivida sob a ditadura militar de Videla, passaram à final e o Brasil consolou-se com o 3º lugar ante a Itália e sem ter sofrido qualquer derrota no Mundial mas muito longe de agradar o seu futebol. A Itália despertava depois do fiasco de 1974 que se seguiu ao agonizante final do México-70 com o Brasil, apareceram os Antognoni e Bettega ante o Pelé Branco chamado Zico. O Argentina-Brasil desse grupo ficou 0-0 e o Holanda-Itália do outro grupo teve a decidi-lo um golo de Haan do meio-campo, sendo inútil a estirada de Zoff. A Itália que vencera o grupo da Argentina ganhando aos anfitriões com golo de Bettega, um dos 12 jogos, em 40, que a RTP transmitiu. O Brasil que ficara em 2º lugar num grupo dominado pela... Áustria, apesar de bater os austríacos de Krankl, Prohaska e Schachner.
 
Estamos a uma 4ª feira em vésperas de Mundial. Os tempos de hoje evocam apenas as glórias recentes, porque a memória é curta e quem a transmite não conheceu os outros tempos. Nas Antas, onde a 3 horas do começo do Porto-Braga já ninguém entrava e todos estavam de pé, amiúde em duas filas nos largos e altos degraus do escuro cimento do estádio, cada jogo era seguido pelo mínio de 50 pessoas. Esse campeonato, salvo pelo golo de Ademir com o Benfica à 28ª jornada, foi terminado em igualdade pontual mas a equipa já era forte e seria sempre reforçada tanto que o bicampeonato veio logo a seguir.
 
Desconfio que o Museu do FC Porto não tem o canto dedicado ao golo de Ademir ou à abertura do marcador por Oliveira a que se seguiu Octávio antes do intervalo, deixando para Gomes o resto na 2ª parte. Há museus que só têm passado recente, amiúde destinados ao culto da personalidade que obscurece tudo o resto. Mas eram muitas dezenas de milhar os adeptos em cada jogo naquela altura.
 
Não foi o campeonato do Pedroto, apesar de conseguir como técnico o que em 1959 conseguira como jogador. Nem do Gomes, do Oliveira ou do Seninho. Foi o campeonato da afirmação de um competidor sério, que fizera uma Taça das Taças formidável (Colónia, M. United e Anderlecht) e ainda chegou ao Jamor para ver fugir a Taça de Portugal numa finalíssima com o Sporting que levou o árbitro Mário Luís, de Santarém mas para sempre um tipo Calabote conhecido por "Chinês", a envergar a fatiota oficial dos leões numa digressão à China.
 
Foi o fim do jejum como se fosse o fim do Ramadão, o Eid, sob temperaturas de deserto. Um jejum que serviu para Rui, g.r. de muitos anos, sagrar-se campeão substituindo Fonseca aos 76 minutos. E uma celebração que não afastava jogadores dos adeptos e Oliveira e Gomes subiam a camionetas de caixa aberta apinhadas de gente a descer a Avenida em festa sem igual.

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