25 dezembro 2013

Parabéns aos primos e primas únicos inter pares

Fazendo jus à nobre tarefa a que se dedicou,  o doutíssimo Tribunal Constitucional, em mais uma clara demonstração de amor à Pátria, declarou (sem apelo possível) inconstitucional o corte nas pensões que o governo queria instaurar com o fim de cumprir as obrigações internacionais que os desmandos de outros determinaram.
 
imagem tirada daqui
 
Nas palavras do dito tribunal, tal chumbo ficou a dever-se à absoluta necessidade de respeitar “o princípio da confiança”, conforme expresso no artigo 2º da Constituição. Consultado tal artigo, verifica-se não constar dele tal princípio. O que quer dizer que, na falta de melhor, se criou um “princípio”, até agora não expresso, mas que o distinto órgão de soberania considerará implícito. O que quer dizer que a Constituição é interpretada a la carte, isto é, quando se quer chegar a uma conclusão política, considera-se implícito o que se revelar útil para “justificar” a decisão. É assim deitado para o caixote do lixo o princípio da certeza jurídica, coisa que, convindo, parece que o TC revoga a seu bel prazer.
Interessante também  é verificar que o “princípio da proporcionalidade”, esse expresso, não se aplica ao caso, pelo menos  no glorioso parecer do TC... e com certeza para grande desgosto do doutor Cavaco, que quereria servir-se dele para defender a sua querida pensãozinha. - no Irritado
 
Artigo 2.º
Estado de direito democrático
A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.
 
E, ainda:
A Constituição da República Portuguesa (edição de 1976, com revisões subsequentes em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 2005) merece ganhar o prémio de livro do ano em 2013. Nunca uma obra política havia estado no centro da vida dos portugueses de um modo tão intenso e polémico. Por essa razão, convém proceder a uma leitura mais atenta da substância da sua narrativa. A mesma tem sido tratada como bíblia sagrada pelos trabalhadores de Portugal, por formular e eternizar a expressão consubstanciada em "direitos inalienáveis" ou ainda "liberdade de expressão". Contudo, os cidadãos do país parecem omitir convenientemente que a mesma magna carta também serviu de cobertura para as excedentárias práticas de transgressão, perpetradas por um sem número de agentes económicos, grupos de interesse, partidos políticos, indivíduos e colectividades. Foi no decurso da sua força constitucional, da sua existência efectiva e da sua vigência desde 1976, que todas as malfeitorias contemporâneas tiveram lugar e que derrearam Portugal, colocando o país na situação em que actualmente se encontra. Por esse facto, há que tirar ilações e também atribuir responsabilidades ao enquadramento jurídico concedido pela Constituição da República Portuguesa. Se a falência técnica, económica, social e moral que retrata o Portugal do presente aconteceu, a mesma decorreu ao abrigo dos valores alegadamente definidos e defendidos na carta constituinte de 1976 (e suas subsequentes alterações em sede de revisão constitucional). Ou seja, a própria constituição também "autorizou" os devaneios dos prevaricadores e fomentou a noção de impunidade jurídica. Deve ser, por isso, também considerada uma colaboradora do regime de descalabro, da demise nacional. Não foi uma outra constituição que serviu de pano de fundo para as ocorrências. Não foi uma distinta constituição, de cariz menos ideológica e mais utilitária, que gerou os desequilíbrios. Não foi uma constituição escrita sem fervor revolucionário que ditou a apropriação indevida por forças de bloqueio económico ou social. Não foi nada disso. Foi sob a batuta desta mesma constituição que os crimes económicos aconteceram, que o fosso entre poderosos e indigentes se cavou, que os sindicatos nasceram mas não evoluíram para avançar a sua missão de protecção de trabalhadores, que os partidos políticos se transformaram em lobbies-sombra para partilhar privilégios e favores e que a soberania foi posta em causa de um modo tão leviano com a assinatura do tratado de adesão às comunidades europeias. Ou seja, Portugal "aconteceu" debaixo da parábola da Constituição da República Portuguesa, e, por essa razão, torna-se urgente ajuízar se a mesma é ainda capaz de defender o país dos seus inimigos endémicos e das ameaças exteriores. Por estas razões, e outras que me escapam, mas que igualmente nos afligem, a Constituição da República também deve ser entendida como uma jangada de pedra. Com o naufrágio à vista, seria sensato analisar em detalhe a carta de marear. O mapa que também contribuiu para desviar Portugal da sua rota - destino malfadado, sina, sorte ou azar. - no Estado Sentido

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